domingo, 18 de abril de 2010

Muito mais que apenas propaganda

Quando paramos para ver um videoclipe normalmente tratamos este pequeno vídeo como uma ação promocional da mesma. Mas, os clipes (como são mais conhecidos) são muito mais do que peças de autopromoção da música e da banda. Os clipes são extensões das bandas/artistas e seus diretores, roteiros originais e umas das formas de sincronia midiática moderna mais abrangente que existe.

Quanto sua criação é dada como os primeiros clipes, os vídeos promocionais gravados por Elvis Presley para as televisões americanas e difundidos no resto do mundo. Lembrando que Elvis é mundialmente reconhecido sem nunca ter saído dos Estados Unidos. Alguns estudiosos contam como primeiro videoclipe o vídeo promocional do filme “Cantando na Chuva”, no qual a Gene Kelly canta a música “I Singin 'in the Rain", um clássico absoluto.

A difusão foi nos anos 1960, com os Beatles e a consolidação nos 1980, com o (clipe) mini-documentário “Thriller” de Michael Jackson e a inauguração da MTV americana criando uma forma definitiva de mostrar as bandas/artistas e coagulação do marketing. Desde então os clipes são ações promocionais dos álbuns dos artistas e de suas músicas. Só que os clipes com o tempo ganhou novas formas de ver e ser visto. Os artistas começaram a usá-los para autopromoção e solidificação de marcas e estilos. Como também forma de chegar a um público maior em Países em que normalmente não fazem shows. A exemplo de Elvis numa era pré-internet.

De começo renegado por muitos que achavam uma forma menor. O tempo e o aprimoramento das artes gráficas atraíram novos e velhos diretores para fazer clipes. E assim a estética fragmentada dos clipes ganhou ainda mais corpo na sua iconografia. O teatro, a literatura, a história da humanidade, a fotografia, a moda e lógico o cinema foi se misturando cada vez mais, formando uma almagama de referências nunca visto.

Os longas-metragens não poderiam ter intervalos tão curtos nas montagens, os curtas-metragens não poderiam ser tão abertos as conclusões e visões como apenas os clipes se mostraram. Exemplo desta forma única de se fazer alusão distintas a mesma coisa é o clipe da música “One” do U2. Uma mesma música- com tempo, batida e letra igual- e três visões (versões) diferentes. O primeiro vídeo a ser feito foi pelo fotografo Anton Corbijin que retrata a música como um desabafo sobre a morte de um pai para um filho, como o compositor da música Bono Vox informou ao diretor. Neste vídeo a sexualidade é tratada de forma não convencional. E os membros da banda aparecem ora vestidos de mulher, ora com suas roupas normais e a interação do verdadeiro pai do Bono no vídeo e a cena final dos carros com imagens de um homem e uma mulher se conectando no fim. Este vídeo foi descartado porque os fundos arrecadados com esta música seriam todos doados a instituições de combate a AIDS e a banda ficou receosa de interpretações maliciosas do vídeo.

Assim foi chamado Mark Pellington para se fazer um segundo vídeo. E como alusão foi usado o quadro de David Woinorowicz, com a imagens de búfalos que se jogam em um precipício. Com quatro imagens lentas e poucas frases, o vídeo foi considerado artístico demais para ser repetido exaustivamente na MTV, apesar de ter sido bem aceito pelo público. Por isso um terceiro vídeo foi feito por Phill Joanou, com imagens simples do Bono bebendo em um bar enquanto canta a música e inserções de uma mulher em rápidos frames e da banda tocando em um show capturado e uma câmera super-8. Foi a primeira vez que a banda teve um clipe no clima romântico homem-mulher.

Três diferentes referências para um mesmo meio. São as seleções escolhidas por três diferentes agentes que compartilham três diferentes reações oriundas primordialmente de três referencias básicas transformando o corredor de tramas em elementos de suportes. E como diz Syd Field: “adaptar é o mesmo que escrever um roteiro original”, o clipe é uma transmutação de outros meios com só ele poderia se formar.

Apenas o clipe pode ser uma conjunção e disjunção ao mesmo tempo. Ele lembra o cinema, mas, é ainda mais rápido. Mesmo alguns filmes terem montagens tidas como de clipes (ex: “Cidade de Deus”, “Clube da luta” e “Corra, Lola, Corra”). Lembra o teatro, só que mais invasivo. É visual como a fotografia, só que mais diversificado. É como uma propaganda de TV ou ação de marketing mais profunda e por muitas vezes muito mais artística e original.

O videoclipe é uma extensão das outras formas de comunicação e a única que junta todas e as misturas de uma forma homogenia. Trazendo novas interpretações ao já conhecido. É uma forma de espetáculo sólida e uma forma de arte crescente. Com novas técnicas sendo primeiro experimentados nela sem remorsos e tendo hoje o Youtube como proliferação mundial. Os clipes revolucionaram e ainda vão revolucionar por ser uma forma aberta a experimentações, que geralmente são bem aceitas.

Pelo clipe artistas como Madonna, Lady Gaga, Beyonce, Michael Jackson e movimentos sociais como o Punk e hip-hop levam sua escopofilia ao mundo. O clipe é hibrido e único. Mexe com os sentimentos e íris na velocidade de seus cortes. O clipe forma gêneros musicais e visuais. E fortunas, é claro, aos seus produtores. Outros meios se tornam formas parecidas mais nunca iguais à outra. A não ser o videoclipe, que é a perfeita junção do cinema, fotografia, literatura, teatro, música diretamente para o formato de uma televisão ou agora tela dos computadores e celulares.

Os videoclipes também são narrativas transmídias, por aglutinar ao mesmo tempo um grande número referências. Mesmo assim tornando-se algo inédito. Os clipes não são apenas filminhos das músicas para promoção dela e da banda/artista. É a convivência e a convergência das mais diversas formas de mídia. É uma interpretação dos fatos, como dizia Nietzsche. E molda muito mais do que consciência fragmentada, caro Renato Ortiz. Ela formaliza as visões do século XXI, mesmo sendo criada no século anterior.

Façam suas interpretações e moldem suas listas com seus clipes prediletos. E busquem conhecer as referências que os artistas e principalmente os diretores deixam em cada segundo como pequenos segredos a espera de serem descobertos.

Rafael Barreto

Ra: 1940775

2 comentários:

  1. Lendo seu texto, comecei a lembrar da banda OK Go:
    http://www.youtube.com/watch?v=dTAAsCNK7RA
    http://www.youtube.com/watch?v=UJKythlXAIY
    http://www.youtube.com/watch?v=qybUFnY7Y8w

    E do MysteryGuitarMan

    http://www.youtube.com/watch?v=a7gs-oo8BUM
    http://www.youtube.com/watch?v=I91xa2pO2vE
    http://www.youtube.com/watch?v=EQXA7ErL708

    Ambos estão revolucionando a visão que tínhamos de videoclipe. Quando pensávamos que a criatividade dos artistas chegaria ao fim, exatamente porque a MTV, muito possivelmente, exibirá cada dia menos clipes musicais e mais reality shows, esses dois exemplos nos mostram que a utilização das novas tecnologias será benéfica para os artistas.

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  2. Por que a MTV exibirá cada vez menos clipes? Qual a função original deste formato audiovisual? Essa função sofreu mudanças na era digital?
    A mudança paradigmática do que é um videoclipe tem relação com a mudança paradgmática da indústria fonográfica no mundo?

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